Supremo Tribunal Federal (STF)

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Nélson HUNGRIA

"Ciência penal não é só interpretação hierática da lei, mas, antes de tudo e acima de tudo, a revelação de seu espírito e a compreensão de seu escopo para ajustá-lo a fatos humanos, a almas humanas, a episódios do espetáculo dramático da vida." (Hungria)

sábado, 26 de dezembro de 2015

Estatuto do Desarmamento: Atipicidade da conduta de posse ilegal de arma de fogo de uso permitido com registro vencido

Não configura o crime de posse ilegal de arma de fogo (art. 12 da Lei nº 10.826/2003) a conduta do agente que mantém sob guarda, no interior de sua residência, arma de fogo de uso permitido com registro vencido. Se o agente já procedeu ao registro da arma, a expiração do prazo é MERA IRREGULARIDADE administrativa que autoriza a apreensão do artefato e aplicação de multa. A conduta, no entanto, não caracteriza ilícito penal. 

Ex: a Polícia, ao realizar busca e apreensão na casa de João, lá encontrou um revólver, de uso permitido. João apresentou o registro da arma de fogo localizada, porém ele estava vencido há mais de um ano. João não praticou crime de posse ilegal de arma de fogo (art. 12 da Lei nº 10.826/2003). STJ. 

Corte Especial. APn 686-AP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 21/10/2015 (Info 572).

Argumentos:

  • Não há DOLO do agente que procede ao registro e, depois de expirado o prazo, é apanhado com a arma nessa circunstância. 
  • Trata-se de uma irregularidade administrativa. Isso porque se a pessoa possui o REGISTRO da arma de fogo de uso permitido, significa que o Poder Público tem completo CONHECIMENTO de que ele possui o artefato em questão, podendo rastreá-lo, se necessário. Logo, inexiste OFENSIVIDADE na conduta.
  • A mera inobservância da exigência de recadastramento periódico não pode conduzir à incriminação penal. Cabe ao Estado APREENDER a arma e aplicar a punição administrativa pertinente, não estando em consonância com o Direito Penal moderno deflagrar uma ação penal para a imposição de pena tão somente porque o indivíduo - devidamente autorizado a possuir a arma pelo Poder Público, diga-se de passagem - deixou de ir de tempos em tempos efetuar o recadastramento do artefato. Portanto, até mesmo por questões de POLÍTICA CRIMINAL não há como submeter o paciente às agruras de uma condenação penal por uma conduta que não apresentou nenhuma LESIVIDADE relevante aos bens jurídicos tutelados pela Lei nº 10.826/2003, não incrementou o risco e pode ser resolvida na via administrativa.
  •  O direito penal possui caráter SUBSIDIÁRIO e de ULTIMA RATIO.

sábado, 5 de dezembro de 2015

Requisição pelo "Parquet" de informações bancárias de contas públicas: inocorrência de violação de sigilo bancário

Importante julgado do STJ, assinalando que as contas públicas não estão abrangidas pelo sigilo bancário a que alude a LC nº 105/2001, uma vez que operações deste jaez estão submetidas aos princípios da administração pública insculpidos no art.37 da Lei Fundamental, sobretudo aos princípios da publicidade e da moralidade:

REQUISIÇÃO PELO MP DE INFORMAÇÕES BANCÁRIAS DE ENTE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.
 
Não são nulas as provas obtidas por meio de requisição do Ministério Público de informações bancárias de titularidade de prefeitura municipal para fins de apurar supostos crimes praticados por agentes públicos contra a Administração Pública. 

É pacífico na doutrina pátria e na jurisprudência dos Tribunais Superiores que o sigilo bancário constitui espécie do direito à INTIMIDADE/PRIVACIDADE, consagrado no art. 5º, X e XII, da CF. No entanto, as contas públicas, ante os princípios da PUBLICIDADE e da MORALIDADE (art. 37 da CF), não possuem, em regra, proteção do direito à intimidade/privacidade e, em consequência, não são protegidas pelo sigilo bancário.

Na verdade, a intimidade e a vida privada de que trata a Lei Maior referem-se à pessoa humana, aos INDIVÍDUOS que compõem a sociedade e às pessoas jurídicas de direito PRIVADO, INAPLICÁVEIS tais conceitos aos ENTES PÚBLICOS.

Ademais, entendeu o STF que as "Operações financeiras que envolvam RECURSOS públicos não estão abrangidas pelo sigilo bancário a que alude a Lei Complementar nº 105/2001, visto que as operações dessa espécie estão submetidas aos PRINCÍPIOS da administração pública insculpidos no art. 37 da Constituição Federal" (MS 33.340-DF, Primeira Turma, DJe de 3/8/2015). Decisão monocrática citada: STJ, RCD no HC 301.719-CE, DJe 13/3/2015.  

HC 308.493-CE, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 20/10/2015.

Inocorrência de ação controlada ante a ausência da meta de atingir o "peixe graúdo"

DIREITO PROCESSUAL PENAL. HIPÓTESE DE INOCORRÊNCIA DE AÇÃO CONTROLADA.

A investigação policial que tem como única finalidade obter informações mais concretas acerca de conduta e de paradeiro de DETERMINADO traficante, sem pretensão de identificar outros suspeitos, NÃO configura a ação controlada do art. 53, II, da Lei 11.343/2006, sendo DISPENSÁVEL a autorização judicial para a sua realização. 

Como se extrai do art. 53, II, da Lei 11.343/2006, a ação controlada tem como finalidade "[...] identificar e responsabilizar maior número de integrantes de operações de tráfico [...]". Nesse sentido, a doutrina afirma que a ação controlada consiste em RETARDAR a intervenção policial com a meta de atingir o "peixe graúdo", sem que se dissemine a prisão dos meros carregadores de drogas ilícitas, atuando por ordem dos verdadeiros comandantes da operação, traficantes realmente perigosos. 

Assim, a investigação policial que almeja apenas obter informações mais concretas acerca de condutas e de paradeiro de determinado traficante, sem pretensão de identificar OUTROS suspeitos, não configura ação controlada, sendo dispensável a autorização judicial para a sua realização.  

RHC 60.251-SC, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 17/9/2015.