Por: Marcelo Semer - Juiz de Direito do Tribunal de Justiça de São Paulo
... um homem, uma sentença....
Revi nesta semana, o primoroso Doze Homens e Uma Sentença (12 Angry
Men, Sidney Lumet, 1957) e recomendo vivamente para todo aquele que
estuda, trabalha ou aprecia o mundo jurídico, embora não só este.
Serve como uma preciosa aula de direito. Não daquelas prenhes de
conceitos e de abstrações, mas, fundamentalmente, do direito que existe
na vida real. Uma mostra contundente do que são feitas as decisões.
Preconceito, pragmatismo, dogmas. O
mundo lá fora não é preenchido apenas pelo dever ser que moldam as
normas jurídicas - mas pelos desvios, perversões e fragilidades
inerentes a todo ser humano.
Quem
quiser aprender o direito apenas na lei não chegará a um porto seguro.
O filme mostra a realidade típica do direito norte-americano - todo ele
se passa na sala secreta destinada à reunião dos jurados e a construção
coletiva do veredito.
No
Brasil, os jurados são sete não doze; suas decisões são secretas, por
votos em urnas, em resposta a quesitos. Não existe o diálogo que o filme
nos propicia, por intermédio do qual podemos conhecer não apenas a
criação da decisão, mas, sobretudo, a desconstrução da obviedade, do
simplismo e do atavismo que muitas vezes formata uma sentença.
Mesmo
assim, tudo que vemos lá nos ensina e muito. E não apenas sobre
jurados. Davis (Henry Fonda) é o único entre os doze que tem dúvidas
sobre a culpa do réu, acusado de matar o pai a facadas, não obstante os
inúmeros indícios trazidos durante o julgamento.
Ao
invés de se curvar à ampla maioria e permitir que o júri termine
rapidamente como se espera, ele desmonta uma a uma as versões até então
apresentadas - instando seus colegas de bancada a se fazer as perguntas
que já deveriam ter feito, antes de chegar às apressadas conclusões.
A
perseverança de Davis em buscar o convencimento, com base na reflexão e
no questionamento, reproduz mais do que um modelo próprio de cognição.
É, sobretudo, uma contundente crítica. Crítica
à decisão apressada – que as estatísticas buscam nos impor; à decisão
preconceituosa – que já vem pronta antes do processo nascer; à decisão
fundada em critérios abstratos e lógicos – mas que desconsidera o ser
humano, suas vicissitudes e sofrimentos; à decisão preguiçosa – que
troca a independência pelo desejo da maioria; à decisão submissa, que
cede ao peso da tradição, porque esta não nos obriga a raciocinar ou
compreender a realidade.
Julgar é necessariamente um processo doloroso.
Não é fácil, não é rápido, não é repetitivo, não é confortável.
Quem
não quer sofrer com a dúvida, se inquietar com as contradições ou se
deparar com dramas humanos que não têm respostas singelas, quem teme
desagradar partes, colegas ou maiorias quaisquer que sejam elas, não se
sentirá bem como juiz.
Por
que, ainda quando não for possível assistir ao diálogo de consciência,
que o roteiro distribui de forma brilhante entre indivíduos tão
distintos, é preciso entender que ele sempre acontecerá, mesmo quando
estivermos diante apenas de um homem e uma sentença.
Fonte: http://heloisaquaresma.blogspot.com.br/2012/01/doze-homens-e-uma-sentenca.html
PARABENS Dr. Semer. Oxala todos os nossos magistrados pensem como V.Excia.Guilherme
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