Supremo Tribunal Federal (STF)

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Nélson HUNGRIA

"Ciência penal não é só interpretação hierática da lei, mas, antes de tudo e acima de tudo, a revelação de seu espírito e a compreensão de seu escopo para ajustá-lo a fatos humanos, a almas humanas, a episódios do espetáculo dramático da vida." (Hungria)

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Investigação com base em denúncia anônima. Quando é possível?

Recentemente o STJ publicou notícia sobre a consolidação do entendimento de que a denúncia anônima “exclusiva” não pode servir de base para a ação penal. De acordo com o Tribunal da Cidadania, a orientação fundamenta-se no raciocínio segundo o qual não se pode movimentar a polícia e o Judiciário tendo como base apenas uma notícia feita às ocultas, mesmo porque a própria Lei Maior veda o anonimato.


Abaixo transcrevemos alguns trechos de julgados neste sentido:


HABEAS CORPUS Nº 64.096 - PR (2006/0171344-7)

RELATOR : MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA

EMENTA

HABEAS CORPUS. SONEGAÇÃO FISCAL, LAVAGEM DE DINHEIRO E CORRUPÇÃO. DENÚNCIA ANÔNIMA. INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL. POSSIBILIDADE. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. IMPOSSIBILIDADE. PROVA ILÍCITA. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. NULIDADE DE PROVAS VICIADAS, SEM PREJUÍZO DA TRAMITAÇÃO DO PROCEDIMENTO INVESTIGATIVO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.

1. Hipótese em que a instauração do inquérito policial e a quebra do sigilo telefônico foram motivadas exclusivamente por denúncia anônima.

2. "Ainda que com reservas, a denúncia anônima é admitida em nosso ordenamento jurídico, sendo considerada apta a deflagrar procedimentos de averiguação, como o inquérito policial, conforme contenham ou não elementos informativos idôneos suficientes, e desde que observadas as devidas cautelas no que diz respeito à identidade do investigado. Precedente do STJ" (HC 44.649/SP, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ 8/10/07).

(...)

3. (...) A delação anônima não constitui elemento de prova sobre a autoria delitiva, ainda que indiciária, mas mera notícia dirigida por pessoa sem nenhum compromisso com a veracidade do conteúdo de suas informações, haja vista que a falta de identificação inviabiliza, inclusive, a sua responsabilização pela prática de denunciação caluniosa (art. 339 do Código Penal).

(...)


RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 23.709 - RS (2008/0114937-1)

RELATORA : MINISTRA LAURITA VAZ

EMENTA

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. DENÚNCIA. RECEBIMENTO. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. NULIDADE. INEXISTÊNCIA. DELITO PERMANENTE. SITUAÇÃO DE FLAGRÂNCIA. EXPEDIÇÃO DE MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO. DESNECESSIDADE. SUBSCRIÇÃO DO AUTO DE APREENSÃO POR DUAS TESTEMUNHAS. AUSÊNCIA. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. ERRO DE CAPITULAÇÃO. PEDIDO PREJUDICADO.

(...)

3. Não obstante seja a acusação anônima insuficiente para a abertura de inquérito policial, nada impede que ela dê ensejo a uma investigação preliminar e que, apurados os fatos, seja instaurado o inquérito policial e, posteriormente, a ação penal.

(...)


HABEAS CORPUS Nº 53.703 - RJ (2006/0023241-0)

RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA

EMENTA

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. INQUÉRITO POLICIAL. INSTAURAÇÃO. "DENÚNCIA ANÔNIMA". SUPERVENIENTE COLHEITA DE PROVAS ANTES DA INSTAURAÇÃO DA FORMAL INVESTIGAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. AUSÊNCIA. NOTÍCIA DE FALECIMENTO DE UM DOS PACIENTES. ORDEM PREJUDICADA EM PARTE.

1. A Constituição Federal veda o anonimato, o que tinge de ilegitimidade a instauração de inquérito policial calcada apenas em comunicação apócrifa. Todavia, na hipótese, a notícia prestou-se apenas a movimentar o Ministério Público que, após diligenciar, cuidou de, higidamente, requisitar o formal início da investigação policial.

(...)


No Supremo Tribunal Federal, a orientação é no mesmo sentido:



HC 84827 / TO - TOCANTINS

HABEAS CORPUS

Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO

Ementa

ANONIMATO - NOTÍCIA DE PRÁTICA CRIMINOSA - PERSECUÇÃO CRIMINAL - IMPROPRIEDADE. Não serve à persecução criminal notícia de prática criminosa sem identificação da autoria, consideradas a vedação constitucional do anonimato e a necessidade de haver parâmetros próprios à responsabilidade, nos campos cível e penal, de quem a implemente.

Neste caso, entendeu-se que “admitir a instauração da investigação com base exclusivamente em denúncia anônima daria guarida a uma prática atentatória contra a vida democrática e a segurança jurídica, incentivando a repetição do procedimento e inaugurando uma época de terror, “em que a honra das pessoas ficará ao sabor de paixões condenáveis, não tendo elas meios de incriminar aquele que venha a implementar verdadeira calúnia””.

Ressalte-se, entretanto, que a orientação para que não se deflagre investigação e/ou processo exclusivamente em denúncia anônima não quer significar que não se possa colher outras provas com base na denúncia apócrifa.

Conforme já nos manifestamos, para que um procedimento investigatório seja iniciado após diligências feitas com base em denúncia anônima, há que se destacar três momentos relevantes: (a) denúncia anônima; (b) diligências investigativas posteriores; (c) instauração do inquérito policial (ou adoção de alguma medida cautelar).

Presentes os dois primeiros atos, resulta legitimado o terceiro. O que não parece tolerável, e esta é também a orientação jurisprudencial como pudemos ver, é instaurar inquérito diretamente a partir da denúncia anônima, sem a realização das devidas investigações preliminares (para se apurar a veracidade mínima da denúncia).

Como citar este artigo: GOMES, Luiz Flávio. SOUSA, Áurea Maria Ferraz de. Investigação com base em denúncia anônima. Quando é possível? Disponível em http://www.lfg.com.br - 07 de dezembro de 2010.

Fonte: www.lfg.com.br

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