EMENTA: HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. ART. 44 DA LEI 11.343/2006:
IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE EM PENA
RESTRITIVA DE DIREITOS. DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE.
OFENSA À GARANTIA CONSTITUCIONAL DA
INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA (INCISO XLVI DO ART. 5º DA CF/88). ORDEM
PARCIALMENTE CONCEDIDA.
1. O processo de individualização da pena é um caminhar no rumo da
personalização da resposta punitiva do Estado, desenvolvendo-se em três
momentos individuados e complementares: o legislativo, o judicial e o
executivo. Logo, a lei comum não tem a
força
de subtrair do juiz sentenciante o poder-dever de impor ao delinqüente a
sanção criminal que a ele, juiz, afigurar-se como expressão de um
concreto balanceamento ou de uma empírica ponderação de circunstâncias
objetivas com protagonizações subjetivas
do
fato-tipo. Implicando essa ponderação em concreto a opção
jurídico-positiva pela prevalência do razoável sobre o racional; ditada
pelo permanente esforço do julgador para conciliar segurança jurídica e
justiça material.
2. No momento sentencial da dosimetria da pena, o juiz sentenciante se
movimenta com ineliminável discricionariedade entre aplicar a pena de
privação ou de restrição da liberdade do condenado e uma outra que já
não tenha por objeto esse bem jurídico
maior da liberdade física do sentenciado. Pelo que é vedado subtrair da
instância julgadora a possibilidade de se movimentar com certa
discricionariedade nos quadrantes da alternatividade sancionatória.
3. As penas restritivas de direitos são, em essência, uma alternativa
aos efeitos certamente traumáticos, estigmatizantes e onerosos do
cárcere. Não é à toa que todas elas são comumente chamadas de penas
alternativas, pois essa é mesmo a sua natureza:
constituir-se num substitutivo ao encarceramento e suas seqüelas. E o
fato é que a pena privativa de liberdade corporal não é a única a
cumprir a função retributivo-ressocializadora ou restritivo-preventiva
da sanção penal. As demais penas também são
vocacionadas para esse geminado papel da
retribuição-prevenção-ressocialização, e ninguém melhor do que o juiz
natural da causa para saber, no caso concreto, qual o tipo alternativo
de reprimenda é suficiente para castigar e, ao mesmo tempo, recuperar
socialmente o apenado, prevenindo comportamentos do gênero.
4. No plano dos tratados e convenções internacionais, aprovados e
promulgados pelo Estado brasileiro, é conferido tratamento diferenciado
ao tráfico ilícito de entorpecentes que se caracterize pelo seu menor
potencial ofensivo. Tratamento diferenciado,
esse, para possibilitar alternativas ao encarceramento. É o caso da
Convenção Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de Substâncias
Psicotrópicas, incorporada ao direito interno pelo Decreto 154, de 26 de
junho de 1991. Norma supralegal de
hierarquia intermediária, portanto, que autoriza cada Estado soberano a
adotar norma comum interna que viabilize a aplicação da pena
substitutiva (a restritiva de direitos) no aludido crime de tráfico
ilícito de entorpecentes.
5. Ordem parcialmente concedida tão-somente para remover o óbice da
parte final do art. 44 da Lei 11.343/2006, assim como da expressão
análoga “vedada a conversão em penas restritivas de direitos”, constante
do § 4º do art. 33 do mesmo diploma legal.
Declaração incidental de inconstitucionalidade, com efeito ex nunc, da
proibição de substituição da pena privativa de liberdade pela pena
restritiva de direitos; determinando-se ao Juízo da execução penal que
faça a avaliação das condições objetivas e
subjetivas da convolação em causa, na concreta situação do paciente.
(HC 97256, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 01/09/2010, DJe-247 DIVULG 15-12-2010 PUBLIC 16-12-2010 EMENT VOL-02452-01 PP-00113 RT v. 100, n. 909, 2011, p. 279-333)
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