Supremo Tribunal Federal (STF)

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Nélson HUNGRIA

"Ciência penal não é só interpretação hierática da lei, mas, antes de tudo e acima de tudo, a revelação de seu espírito e a compreensão de seu escopo para ajustá-lo a fatos humanos, a almas humanas, a episódios do espetáculo dramático da vida." (Hungria)

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Dez razões que justificam a investigação pelo MP


Na contramão do processo de amadurecimento da nossa jovem democracia e de fortalecimento das nossas instituições republicanas, um grupo de deputados e senadores tenta acrescentar à Constituição Federal um dispositivo que limitará a atuação do Ministério Público no combate à criminalidade, impedindo promotores e procuradores da República de investigar crimes.

A Proposta de Emenda Constitucional 37/2011, apelidada de “PEC da impunidade”, já foi aprovada por uma Comissão Especial da Câmara dos Deputados e agora será submetida ao Plenário daquela Casa antes de seguir para o Senado. A vingar a ideia, criminosos de colarinho branco e políticos corruptos terão muito que comemorar, pois estarão blindados contra a atuação dos profissionais que recentemente fizeram vir à tona inúmeros escândalos em que os pivôs eram altas autoridades da República e que por isso mesmo, estavam praticamente imunes à ação das polícias.

Diante do risco de aprovação da tal proposta, o Ministério Público, a imprensa e diversas entidades da sociedade civil têm procurado esclarecer a sociedade sobre alguns relevantes aspectos que envolvem o tema, dentre os quais merecem destaque:

1 – Em nosso modelo constitucional, o Ministério Público é o fiscal e o defensor da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. É ilógico pretender que alguém fiscalize sem investigar.

2 – O Ministério Público brasileiro não quer substituir as polícias na investigação criminal. Em regra, os crimes devem ser investigados pela Polícia, cabendo ao Ministério Público o controle externo dessa atividade e a requisição de diligências que considerar importantes para que o processo criminal seja iniciado com maiores chances de êxito.

3 – A Polícia Federal e as polícias civis integram a estrutura do Poder Executivo e os delegados de Polícia não estão garantidos com a vitaliciedade e a inamovibilidade conferidas aos membros do Ministério Público. Se, na maioria dos casos, essa realidade não tem relevância, o mesmo não pode ser dito quando os suspeitos são autoridades públicas, criminosos com influência sobre o poder político ou policiais.

4 – Em nenhum país desenvolvido, o Ministério Público é impedido de investigar. Pelo que se tem notícia, apenas na Indonésia, na Uganda e no Quênia existe exclusividade da Polícia na apuração de crimes. Em países como Alemanha, França, Itália e Portugal, a Polícia investiga sob a direção e a coordenação do Ministério Público.

5 – Há uma tendência mundial de aumentar o número de entidades autorizadas a investigar atos ilícitos. No Brasil, a lei autoriza investigações dirigidas pelo Poder Judiciário, tribunais de Contas, Receita Federal, Banco Central, polícias, CPI’s, Ibama, Ministério Público etc. Quanto maior o número de entidades autorizadas a fiscalizar, pior para os criminosos e melhor para a sociedade.

6 – A PEC 37/2011 é incompatível com o propósito de compromissos internacionais assumidos pelo Brasil. A participação de autoridades independentes na investigação criminal é prevista na Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Convenção de Palermo), na Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (Convenção de Mérida), no Estatuto de Roma (Tribunal Penal Internacional) etc.

7 – Ao contrário do que afirmam os idealizadores da PEC, a lei já autoriza o Ministério Público a realizar atos de investigação criminal, como requisitar e ouvir testemunhas, requisitar documentos e perícias, realizar inspeções etc. (artigos 7º e 8º da LC 75/93, artigos 26 e 27 da Lei 8.625/93, artigo 47 do CPP etc.). Para dar maior segurança e objetividade aos procedimentos investigativos, o Conselho Nacional do Ministério Público regulamentou a matéria com a Resolução 13/2006.

8 – A aprovação da PEC distanciará o Ministério Público da sociedade, dificultará o acesso das pessoas à Justiça e burocratizará a apuração de crimes. Não é incomum que pessoas do povo demandem o Ministério Público para apresentar provas de crimes ou relatar uma situação que exige intervenção urgente do Estado, a exemplo da prisão preventiva de um criminoso e do deferimento de uma medida protetiva da Lei Maria da Penha. Aprovada a PEC, o Ministério Público terá que adotar o caminho mais longo: deverá encaminhar os cidadãos à Delegacia de Polícia para instauração de um inquérito que, dias ou meses depois, retornará ao Ministério Público para as providências cabíveis.

9 – Modificada a Constituição, inúmeros criminosos poderão ficar livres de suas penas, caso consigam emplacar a tese de nulidade dos processos em que houve algum ato de investigação criminal pelo Ministério Público.

10 – O STF e outros tribunais do país já reconheceram a legitimidade de atos de investigação realizados pelo Ministério Público (cf. RE 535.478, HC 93.930, HC 94.173, HC 97.969).

Por fim, uma pergunta: a quem interessa a aprovação da PEC da impunidade? Responda o leitor. À sociedade é que não é.
Lucas Salomé Farias de Aguiar é promotor de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal.

Revista Consultor Jurídico, 15 de abril de 2013

Um comentário:

  1. Respostas: 1- Não é ilógico dizer que o MP não pode investigar criminalmente, assim quis a constituinte de 88, ao MP cabe requisitar e acompanhar investigações, isso em nada prejudicaria sua atuação. 2 -Certamente que nem uma nem outra instituição deseja ocupar o papel da outra, a PEC apenas restabelece a legalidade. 3 - A independência e autonomia dos promotores só vão até a página n°2. O PGJ é nomeado pelo chefe do executivo e isto ja é o suficiente pra deixá-lo não tão a vontade nas investigações de apadrinhados, veja o que aconteceu agora no RJ e no ES, onde os PGJ´s são suspeitos de favorecer criminosos poderosos.4 - NO Congo, Burundi, Niger e Moçambique o MP investiga e nesses países não existe inquérito policial, no entanto, são os países mais pobres do mundo e com alto indice de corrupção. Não devemos misturar a forma que um país adota para sua persecução criminal com seu indice de desenvolvimento, uma coisa nda tem a ver com a outraa. Veja que na Inglaterra é a polícia quem investiga e até mesmo auxilia na denúncia. Nos EUA o promotor pode ser exonerado pelo Prefeito, aqui no Brasil não, em outros países da Europa o MP faz parte da carreira da magistratura e aqui não. Essas comparações não servem. 5 - Todas essas instituições citadas vão continuar com suas atribuições intocáveis, o que a pec fala é da investigação criminal. A Receita federal por exemplo poderá encaminhar relatórios de suas fiscalizações diretamente ao MP para que este ofereça denúncia. ¨- Outra mentira do MP. Em relação ao estatuto de Roma e outros tratados internacionais saiba que As convenções de Palermo (contra o crime organizado), de Mérida (contra a corrupção) e a das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional determinam tanto a participação do Ministério Público quanto da Polícia Judiciária no combate a esses crimes. Mas frisa que a atuação de cada um, assim como das demais autoridades, está regulada no ordenamento jurídico pátrio que não contempla a investigação criminal autônoma produzida diretamente pelos membros do Ministério Público. 7 - Investigação é matéria que restringe direito individual e em tal seara somente LEI em sentido estrito pode regulamentar. A resolução 13 exorbitou completamente seu poder regulamentar e é contestada no STF. 8 - A PEC não impedirá nada do que foi relatado nesse item nº 8, o MP sempre que tiver elementos suficientes pra denunciar poderá continuar a fazê-lo. 9 - Mais uma inverdade. A PEC ressalva que todas as investigações realizadas pelo MP serão convalidadas. Basta ler seus substitutivos. 10 - Mais uma inverdade, O STF discute atualmente tal atribuição do mp e o placar sendo a favor ou contra será bem apertado. Jurisprudência há pra todo gosto.

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