O Processo Penal como sismógrafo da Constituição e o Supremo Tribunal Federal - teoria, análise crítica e práxis - por Júlio Medeiros.
Nélson HUNGRIA
"Ciência penal não é só interpretação hierática da lei, mas, antes de tudo e acima de tudo, a revelação de seu espírito e a compreensão de seu escopo para ajustá-lo a fatos humanos, a almas humanas, a episódios do espetáculo dramático da vida." (Hungria)
sexta-feira, 7 de janeiro de 2011
DECISÃO_Sentença que condenou o médico Roger Abdelmassih a 278 anos de prisão
EXCESSO DO MP
Juíza decreta prisão do médico Roger Abdelmassih
A juíza substituta Cristina Escher decretou a prisão preventiva do médico Roger Abdelmassih, condenado a 278 anos de prisão pelos crimes de estupro e atentado violento ao pudor de mulheres, entre ex-pacientes e uma ex-funcionária. Ela atendeu ao pedido do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime (Gaeco), que entendeu que o médico demonstrou intenção de fugir do país por ter pedido a renovação de seu passaporte.
Abdelmassih, que aguardava julgamento de recurso em liberdade, compareceu pessoalmente à sede da Polícia Federal de São Paulo para requerer a renovação de seu passaporte. O delegado da PF comunicou a Justiça, que, por sua vez, deu vista ao Ministério Público e oficiou o Supremo Tribunal Federal, que analisa pedido de HC do médico. Os promotores fizeram o pedido de prisão preventiva nesta quinta-feira (6/1).
O advogado de Abdelmassih, José Luiz de Oliveira Lima, enviou petição ao STF, comunicando a corte que a renovação do passaporte é um direito do médico. "Mas diante do sensacionalismo do MP, entramos com uma petição informando da desistência da renovação." Há um pedido de Habeas Corpus do médico em tramitação na corte. Para o advogado, o Ministério Público, ao questionar uma situação inexistente, agiu de maneira arbitrária. "Se fosse para usar, ele usaria o passaporte atual, que não está vencido", disse o advogado, perplexo com a decisão.
Abdelmassih fora condenado antes condenado pela juíza Kenarik Boujikian Felippe, da 16ª Vara Criminal de São Paulo. O médico foi acusado de cometer 56 atos libidinosos, sendo três de estupro, contra 39 pacientes entre 1995 e 2008, na sua clínica de reprodução humana na capital paulista, segundo denúncia do Ministério Público. Ele ficou preso durante quatro meses, de agosto a dezembro de 2009. Obteve liberdade por decisão do Supremo Tribunal Federal.
Pedido exagerado
Em sucessivas decisões, o Supremo Tribunal Federal tem determinado que a intenção de fuga não é algo que se deduza. "É preciso, no mínimo, que o acusado tenha adquirido bilhete aéreo com data de embarque", disse em uma das ocasiões o ministro Celso de Mello.
O presidente da Associação Paulista de Magistrados (Apamagis), desembargador Paulo Dimas de Bellis Mascaretti, afirmou que apenas o pedido de renovação de passaporte não caracteriza, isoladamente, intenção de fuga. "Essa questão deve ser analisada e confrontada com outros elementos para que se caracterize essa intenção." Ele avaliou que o juiz pode, antes de decidir sobre o pedido de prisão preventiva, ouvir o réu para saber o motivo da renovação.
"Ele pode optar por outra medida que não seja a prisão, solicitando que o réu entregue seu passaporte, por exemplo. Tudo vai depender da avaliação que o juiz fizer do caso, com base em os elementos."
Para o criminalista Alberto Zacharias Toron, o fato de alguém pedir a renovação de seu passaporte é mais do que insuficiente para fundamentar um pedido de prisão. "O abuso que a proposta ministerial traduz é notório. A jurisprudência há muito tempo vem advertindo para o fato de que não se pode decretar a prisão preventiva com base em conjecturas. O pedido do MP não é mais do que uma demonstração de como um fértil imaginário pode ensejar o absurdo de uma preventiva por conta de um simples pedido de renovação de passaporte."
A ConJur apurou que, apesar de ter pedido a renovação do passaporte, o documento de Abdelmassih não estava vencido. "Esse é outro elemento que demonstra a falta de interesse de fuga, pois, se houvesse mesmo essa intenção, o médico já teria fugido", afirmou Toron.
Apesar de não conhecer o caso concreto a fundo, o criminalista Fábio Tofic, diretor do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), avalia que, em tese, o MP teve uma postura mais enérgica do que o normal. "Em muitos casos de pessoas que respondem a um crime em liberdade, elas podem sair do país, desde que tenham autorização da Justiça e, para isso, é preciso ter o passaporte. Isso não significa, necessariamente, intenção de fuga."
Por: Ludmila Santos
Fonte: Conjur
Publicado em 6 de janeiro de 2011.
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