Daniel Bernoulli Lucena de Oliveira
Promotor de Justiça do MPDFT
Promotor de Justiça do MPDFT
Participei de uma sessão do tribunal
do júri em que foi ouvido, como testemunha, um indivíduo que havia sido
intérprete de um surdo-mudo na delegacia. O juiz perguntou sobre o
procedimento na polícia, também esclareci alguns pontos, mas, quando o
defensor foi inquiri-lo, o intérprete fez um pedido: “doutor, o senhor
se incomoda de tirar o microfone de frente da boca? É que eu não os ouço
muito bem, mas compreendo o que fala ao ler seus lábios”.
Depois das indagações da defesa, o juiz então consultou os jurados se, por acaso, tinham alguma dúvida e um deles fez uma pergunta. A lei proíbe que os questionamentos sejam feitos diretamente do jurado para a testemunha e, por conta disso, o juiz repetiu a indagação ao intérprete.
A testemunha, desconhecendo a regra
jurídica, tranquilizou o juiz: “excelência, não precisa repetir, eu
entendo o que ele está falando”.
Naquele instante, imaginei o jurado
como um surdo-mudo que precisa de um intérprete para ser entendido. O
intermediador em questão seria o juiz.
O Direito tem dessas coisas.
Enquanto o filósofo é considerado o
homem que fala fácil sobre assuntos difíceis, nós, os operadores do
Direito, deveríamos ser conhecidos como os sujeitos que falam difícil
sobre assuntos simples. Imaginamos que criar um vocabulário
absolutamente paralelo, com expressões arcaicas em línguas mortas, nos
dá a segurança de que ainda somos uma ciência.
Ao público, pelo contrário, tal
linguagem apenas serve para nos afastarmos dele, dando ar de prepotência
e superioridade que, definitivamente, não deveria existir.
Ao final daquele júri, o juiz leu a
sentença e o réu teve que consultar seu advogado para entender se tinha
sido absolvido ou condenado.
Enquanto isso, pensava com meus botões: “hoje, eu, um promotor do júri, tive uma aula de comunicação com esse intérprete”.
Fonte: MPDFT
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