Olá caros Doutores, seguem alguns pontos sobre tráfico de drogas abordados em minha palestra na cidade de Cuiabá/MT
1. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE E O TRÁFICO COMO DELITO PROPULSOR Diferença com o crime de contrabando (art.334 do CP – Importar ou exportar “mercadoria proibida”). Delito propulsor.
Furtos em continuidade delitiva. Homicídio qualificado conexial. Roubos
circunstanciados. Tráfico de armas. Lavagem de dinheiro. Organização
criminosa;
2. NÃO HÁ FLAGRANTE PREPARADO (Súmula 145 do STF), em virtude dos 18 núcleos do tipo, sendo crime de natureza permanente. Diferente de provas plotadas, em que há denunciação caluniosa (particular – art.339 do CP) ou abuso de autoridade (funcionário público – art.4º da Lei 4.898/65). Portanto, há válido flagrante esperado. Insta analisar, neste aspecto, a teoria da serendipidade
(encontro fortuito de provas), sobretudo, quando há interceptação
telefônica. Caso do policial exigindo 5 mil reais de um traficante para
não efetuar a prisão, foram encontradas 12 kg de maconha em seu carro,
sendo que o GAECO investigava apenas a concussão (art.316 do CP).
3. NORMA PENAL EM BRANCO, FATO ATÍPICO E DUPLA TIPICIDADE. A lei de drogas é uma norma penal em branco heterogênea,
visto ser complementada pela Portaria nº 344/SVS da ANVISA, de natureza
administrativa. Algumas substâncias não estão previstas, tais como tolueno
(cola de sapateiro). Pode fazer o agente responder pelo art.243 do ECA
(substância que causa dependência física ou psíquica). Se o agente traz
substância não proibida, de outro país, por exemplo, lança perfume
(Argentina) não pode ser responsabilizado pelo tráfico internacional.
4. DISTINÇÃO ENTRE USUÁRIO E TRAFICANTE E CONSTITUCIONALIDADE DO ART.28 DA LEI. O STF vai analisar a constitucionalidade do art.28
da Lei de Drogas (a droga estimula a prática de toda a sorte de
infrações penais). Distinção entre traficante e usuário ocorre pelo
art.28, § 2º da Lei de Drogas. Não pode haver um critério puramente aritmético,
como se o direito fosse uma ciência exata e as pessoas, fantoches. A
quantidade da droga não é o único indicativo para se concluir se houve
ou não o tráfico (art.28, § 2º da Lei). Por exemplo: 13 pedras de crack
ou comprimidos de ecstasy. Natureza jurídica do artigo: despenalização, segundo o STF;
5. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA EM CRIME
DE USO DE DROGA. Aplicação da insignificância em crime de uso de drogas
em ambientes da Administração Militar choca com os princípios da disciplina e hierarquia das forças armadas. Mínima ofensividade da conduta do agente; ausência de periculosidade social da ação; reduzido grau de reprovabilidade do comportamento do agente e inexpressividade da lesão ao bem juridicamente tutelado (requisitos exigidos para aplicação do princípio).
6. CONDIÇÃO DE USUÁRIO NÃO EXCLUI O TRÁFICO (art.48, § 1º da Lei). Poderá, em última análise, apenas influenciar na imputabilidade do agente (art.46 da Lei).
7. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO E VEDAÇÃO DE ANALOGIA IN MALAN PARTEM. A tipificação da associação (não representa o tráfico em si, mas apenas a finalidade de realiza-lo), além de não ser equiparada a hediondo,
não exclui a prática do art.33, ou seja, eles são cumulativos. Há
discussão sobre eventual “bis in idem”. A lista dos crimes hediondos é exaustiva e não cabe analogia in malam partem. O tráfico privilegiado é crime hediondo. A expressão “reiteradamente ou não” refere-se à prática dos crimes, pois a associação deve ser com ânimo definitivo e permanente. Dessa forma, a associação não se confunde com a simples coautoria, sendo que a reunião ocasional de duas ou mais pessoas não se subsume ao tipo do artigo 35 da Lei de Drogas, conforme entendimento do STJ.
8. PROVA ROBUSTA DO VÍNCULO ASSOCIATIVO.
Sobre o delito de associação para o tráfico de substância entorpecente é
preciso dizer que reclama prova robusta do vínculo associativo, que não
se satisfaz com o auxílio eventual. Desse modo, é INADMISSÍVEL PRESUMIR-SE A COAUTORIA OU PARTICIPAÇÃO NO CRIME DE TRÁFICO,
da mulher, mãe, filha ou irmã de traficante, pelo simples fato de
conviver, com ele, na mesma residência, ainda que tenha conhecimento da
traficância. Nesse sentido: “Saber não constitui crime;
CRIME É SABER E ADERIR À AÇÃO CRIMINOSA do companheiro, agindo, em
conjunto, quer nas mesmas condutas, quer em tarefas específicas, mas que
se destinem à ação criminosa, fato este que não restou demonstrado nos
autos. O só fato de viver maritalmente com um traficante, não
faz da mulher ou do marido um traficante. PARA CONDENAR É PRECISO TER
CERTEZA. Existindo elementos duvidosos, inviável a condenação, aplicando-se o princípio in dubio pro reo
com esteio no art. 386, inc. VI, do Código de Processo Penal” (TJPR –
4ª C.Criminal – AC 0357235-2 – Antonina – Rel.: Des. Antônio Martelozzo –
Unânime – J. 05.10.2006)
9. POSSIBILIDADE DE PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO. É perfeitamente admissível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito, bem como a concessão de liberdade provisória.
Resolução nº 05 do Senado suspendendo a parte final do art.33, § 4º da
Lei, mais precisamente a expressão “vedada a conversão em penas
restritivas de direitos”. Declarada inconstitucional por decisão
definitiva do Supremo Tribunal Federal nos autos do Habeas Corpus nº 97.256/RS,
rel. Min. Ayres Britto, j. em 18.3.2010. Logo, os agentes incursos no
art. 33, §4º, poderão ter suas penas privativas de liberdade
substituídas por restritivas de direitos (desde que observados os
requisitos do art.44 do Código Penal). “O processo de individualização da pena é um caminhar no rumo da personalização da resposta punitiva do Estado”.
10. CONDUTA DO FOGUETEIRO E PRINCÍPIO DA READEQUAÇÃO NORMATIVO-TÍPICA. Fogueteiro do tráfico é conduta típica, de informante (art.37 da Lei), houve readequação normativo-típica (HC 106.155/RJ,
rel. Min. Luiz Fux), Se for para o tráfico e não para um traficante em
específico, haverá associação para o tráfico. Assim como ocorre na
conduta do informante. Existem exceções pluralísticas à teoria monista
no concurso de pessoas.
11. EXIGÊNCIA DE LAUDO DEFINITIVO PARA CONDENAÇÃO. Laudo provisório
(feito na hora – princípio ativo da droga – o promotor pode oferecer a
denúncia) é necessário para a lavratura do auto de prisão em flagrante e
não se confunde com o laudo definitivo (art.50, §§ 1º e 2º). Entendimento inédito da 1ª Turma do STF de que a apresentação do laudo toxicológico definitivo mesmo após a condenação não causa nulidade, sendo necessário demonstrar o prejuízo
(RHC 110.429/MG, rel. Luiz Fux, j.6.3.2012). Vale ressaltar que o STF
possui entendimento tranquilo de que a juntada do laudo toxicológico após as alegações finais não causa nulidade.
12. PECULIARIEDADES DO RITO. Rito da lei, que oportuniza a defesa preliminar antes do recebimento da denúncia. Exigem defesa preliminar também: funcionais afiançáveis, competência originária e JECrim. Outra peculiaridade desse rito é o momento do interrogatório do acusado, que de acordo com o polêmico art.57, é o primeiro ato da instrução (STJ, HC 180.033, de 2012). O STF é firme no sentido de que, havendo crimes conexos ao tráfico de drogas, a adoção do procedimento comum não implica nulidade, pois ele assegura ao acusado o mais amplo espectro de garantias processuais penais (STF, HC 102.430/SP, rel. Ayres Britto).
13. TESE DO INTERROGATÓRIO COMO ÚLTIMO
ATO DO PROCEDIMENTO NA LEI DE DROGAS. Ganha força esta tese, pois ao
apreciar o AgRg na Apn 528/DF, o Plenário do Supremo Tribunal Federal,
pela unanimidade dos eminentes Ministros presentes à sessão, entendeu
que a previsão do interrogatório como último ato da instrução
processual, por ser mais benéfica à defesa, deve ser aplicada às ações
penais originárias, em detrimento do disposto no artigo 7º da
Lei 8.038/1990 (HC 205364/MG, Rel. Ministr JORGE MUSSI, QUINTA TURMA,
julgado em 06/12/2011, DJe 19/12/2011).
14. DIREITO DE APELAR EM LIBERDADE E AS
INOVAÇÕES DA NOVA LEI DE MEDIDAS CAUTELARES. A disposição do art.59 da
lei de drogas está superada há muito tempo, em síntese, o juiz tem de fundamentar os aspectos fático, jurídico e da necessidade, sobretudo com a entrada em vigor da Nova Lei de Medidas Cautelares (Lei 12.403/2011), prisão cautelar só quando necessária e adequada (extrema ratio da ultima ratio – art.282, § 6º do CPP).
15. CONFIGURAÇÃO DO TRÁFICO INTERESTADUAL
E COMPETÊNCIA. A competência em regra é da Justiça Estadual, inclusive,
em se tratando de tráfico interestadual. Com efeito, diz a Súmula 522 do STF: "Salvo ocorrência de tráfico com o exterior, quando, então, a competência será da Justiça Federal, compete à justiça dos Estados o processo e o julgamento dos crimes relativos a entorpecentes". E, conforme o próprio Supremo, não há necessidade de se transpor fronteiras para a configuração do tráfico interestadual, conforme julgamento do HC 99.452/MS,
rel. Min. Gilmar Mendes, j. em 8.10.2010 (no caso concreto, o
denunciado levaria a droga da cidade de Campo Grande/MS para
Rondonópolis-MT). A Polícia Federal pode e deve investigar (repressão uniforme), ela tem atribuição.
Não há qualquer vício, é uma questão de atribuição, até porque o IP é
dispensável. SE caracterizado o tráfico transnacional, a competência
será da Justiça Federal (art.70 da Lei).
16. CAUSA DE AUMENTO DE PENA E TRANSPORTE
PÚBLICO. A posição mais segura a ser adotada em termos de Tribunais
Superiores é afirmar que a SIMPLES UTILIZAÇÃO de transporte público para
a circulação da substância entorpecente ilícita já é motivo suficiente
para a aplicação da CAUSA DE AUMENTO de pena prevista no art. 40, inc.
III, da Lei nº 11.343/2006, não sendo necessária a comercialização
da droga no transporte. Porém, é perfeitamente admissível a encampação
de tese contrária no caso concreto, com fulcro em voto isolado do Min.
Luiz Fux (HC 109.538/MS, j.15.2.2012).
17. APLICAÇÃO DA MINORANTE DO ART. 33, § 4º DA LEI N. 11.343/2006. O
magistrado não pode deixar de aplicar a minorante prevista no § 4º do
art. 33 da Lei n. 11.343/2006 se utilizando exclusivamente dos elementos
descritos no núcleo do referido tipo penal para concluir que o réu se
dedicava à atividade criminosa. O art. 33, § 4º, da Lei n.
11.343/2006 prevê a aplicação de causa especial de diminuição de pena ao
agente de crime de tráfico que tenha bons antecedentes, seja réu
primário, não se dedique a atividades criminosas nem integre organização
criminosa. Para que se negue a aplicação da referida minorante em razão
do exercício do tráfico como atividade criminosa, deve o juiz basear-se
em dados concretos que indiquem tal situação, sob pena de toda e
qualquer ação descrita no núcleo do tipo ser considerada incompatível
com a aplicação da causa especial de diminuição de pena. Precedente
citado: REsp 1.085.039-MG, DJe 28/9/2009. HC 253.732-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 6/12/2012.
18. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL.
Compete à Justiça Federal o julgamento dos crimes de tráfico
internacional de drogas. Entretanto, nem o simples fato de alguns corréus serem estrangeiros, nem a eventual origem externa da droga,
são motivos suficientes para o deslocamento da competência para a
Justiça Federal (Habeas corpus 103.945, STJ). Assim, o crime de tráfico internacional de drogas, para fins de competência da Justiça Federal, é aquele que envolve mais de um país, pouco importando a nacionalidade do réu ou a origem da droga. A internacionalidade está no resultado,
que necessariamente não precisa acontecer, bastando que, pelas
circunstâncias, deduza-se que o agente queria transferir droga de um
país para outro. É a chamada internacionalidade territorial do resultado.
Portanto, para que o crime de tráfico internacional de drogas seja
julgado pela Justiça Federal deve atender aos seguintes requisitos: a) Que o crime esteja previsto em Tratado ou Convenção Internacional e iniciada a execução no País e; b) internacionalidade territorial do resultado relativamente à conduta delituosa.
19. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS.
Sobre o delito de associação para o tráfico de substância entorpecente é
preciso dizer que reclama prova robusta do vínculo associativo que não se satisfaz com o auxílio eventual. Desse modo, é inadmissível presumir-se a coautoria ou participação no crime de tráfico,
da mulher, mãe, filha ou irmã de traficante, pelo simples fato de
conviver, com ele, na mesma residência, ainda que tenha conhecimento da
traficância. Nesse sentido: “Saber não constitui crime; crime é saber e aderir à ação criminosa
do companheiro, agindo, em conjunto, quer nas mesmas condutas, quer em
tarefas específicas, mas que se destinem à ação criminosa, fato este que
não restou demonstrado nos autos. O só fato de viver maritalmente com
um traficante, não faz da mulher ou do marido um traficante. Para condenar é preciso ter certeza.
Existindo elementos duvidosos, inviável a condenação, aplicando-se o
princípio in dubio pro reo com esteio no art. 386, inc. VI, do Código de
Processo Penal” (TJPR – 4ª C.Criminal – AC 0357235-2 – Antonina – Rel.:
Des. Antônio Martelozzo – Unânime – J. 05.10.2006).
20. AUSÊNCIA DE APREENSÃO DA DROGA E O “EXAME INDIRETO”. Conforme entendimento do STJ, a ausência de apreensão da droga não torna a conduta atípica
se existirem outros elementos de prova aptos a comprovarem o crime de
tráfico (HC 131.455-MT, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado
em 2/8/2012. 6ª Turma). Interessante notar que a Corte admitiu a prova
da materialidade delitiva em crime de tráfico de drogas sem a apreensão
de entorpecentes e a respectiva perícia técnica (laudo de constatação). Para tanto, levou em consideração outras provas, dentre elas a quebra de sigilo telefônico.
21. TRÁFICO "PRIVILEGIADO" NÃO É CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO. STF. Plenário. HC 118533, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 23/06/2016. O principal argumento invocado pelo STF foi o de que não seria proporcional tratar o tráfico privilegiado como equiparado a hediondo, sendo esta conduta incompatível com a natureza hedionda. Além disso, foram feitas considerações sobre política criminal, aumento da população carcerária etc.
21. TRÁFICO "PRIVILEGIADO" NÃO É CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO. STF. Plenário. HC 118533, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 23/06/2016. O principal argumento invocado pelo STF foi o de que não seria proporcional tratar o tráfico privilegiado como equiparado a hediondo, sendo esta conduta incompatível com a natureza hedionda. Além disso, foram feitas considerações sobre política criminal, aumento da população carcerária etc.
22. TRÁFICO DE 'MENOR POTENCIAL OFENSIVO'. Trata-se, in casu, da figura do "fornecedor eventual" prevista pelo art. 33, §3º Oferecer droga, eventualmente e sem objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento, para juntos a consumirem: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e pagamento de 700
(setecentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa, sem prejuízo das
penas previstas no art. 28. Portanto, aplica-se os preceitos da Lei 9.099/95 (Juizado Especial Criminal).
23. INCONSTITUCIONALIDADE DO REGIME INICIAL FECHADO. O Pleno do STF declarou a inconstitucionalidade do art.2º, § 1º da Lei 8.072/90, que impunha o regime inicial fechado para crimes hediondos. Esta decisão foi tomada em obediência ao princípio da individualização da pena.
23. INCONSTITUCIONALIDADE DO REGIME INICIAL FECHADO. O Pleno do STF declarou a inconstitucionalidade do art.2º, § 1º da Lei 8.072/90, que impunha o regime inicial fechado para crimes hediondos. Esta decisão foi tomada em obediência ao princípio da individualização da pena.
24. AFASTAMENTO DA SÚMULA 691 DO STF
(conhecimento na hipótese de flagrante constrangimento ilegal), que
diz: “Não compete ao Supremo Tribunal Federal CONHECER de habeas corpus
impetrado contra decisão de relator que, em habeas corpus requerido a
Tribunal Superior, INDEFERE A LIMINAR”. Para aprofundar, leiam o artigo:
“Afastamento hic et nunc da Súmula 691 do STF: supressão de
instância?”. A expressão “hic et nunc” quer dizer: aqui e agora, ou
seja, imediatamente. Destarte, se estiver sendo negada a liberdade
provisória ou as restritivas de direitos, por mero óbice legal, a
aludida Súmula deve ser afastada e, por conseguinte, deferida a ordem de
habeas corpus.
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