A Constituição Federal de 1988 estabelece que os crimes hediondos e os equiparados aos hediondos terão tratamento mais rigoroso, insuscetíveis de alguns Direitos, como graça, anistia e fiança, onde em 1990, como manifestação de um Direito Penal Simbólico entra em vigência a Lei n.º 8.072/90 regulamentando a disposição constitucional e estabelecendo um tratamento mais rígido, conforme determinação da própria Carta Magna.
Uma das situações expressamente previstas na legislação em tela referia-se a vedação da progressão de regime prisional, onde o Supremo Tribunal Federal, alterando entendimento anterior (também por 6 X 5), declarou inconstitucional com fundamento na violação de alguns princípios constitucionais: dignidade da pessoa humana, isonomia, proporcionalidade, individualização da pena e humanidade; decisão esta num controle difuso abstrativizado, conforme tese de Gilmar Ferreira Mendes, Ministro do Supremo Tribunal Federal, onde anteriormente a esta decisão, o Excelso Pretório já havia sumulado o entendimento de que a progressão apenas no delito de tortura, pois a Lei n.º 9.455/97 assim estabelecia (princípio da especialidade e princípio da isonomia) assim como a vedação da progressão de regime prisional seria constitucional, ocorrendo, portanto, uma alteração de entendimento jurisprudencial.
Nesta linha, o tráfico de drogas, delito equiparado a hediondo, surge primeiramente no art. 281 do Código Penal, revogado posteriormente pela Lei n.º 6.368/76, revogada parcialmente (apenas em face de seu aspecto processual, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça) pela Lei n.º 10.409/02, onde o determinou-se a aplicação do procedimento desta última Lei, por ser mais benéfico. Ocorre que esta Lei foi revogada posteriormente pela Lei n.º 11.343/06, a nova Lei de Drogas, que admiti a figura do “tráfico privilegiado”, ou seja, determinando que preenchidos alguns requisitos legais, a pena será diminuída.
Por questão de tecnicismo jurídico, vale ressaltar que o art. 4º, parágrafo 4º, assim dispõe: “§4o Nos delitos definidos no caput e no § 1o deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.”, portanto, estamos diante de uma causa especial de diminuição de pena aplicável na terceira fase da dosimetria penal e não de um privilégio, pois a pena será diminuída em patamares fracionários e não com relação a uma diminuição abstrata em seu mínimo e máximo, onde parte da doutrina e jurisprudência sempre confunde, assim como ocorre no art. 121, §1º, do Código Penal.
Pois bem, recentemente o Supremo Tribunal Federal, seguindo os moldes do Superior Tribunal de Justiça, preferiu duas decisões sobre o tema que vale a pena trazer a baila:
a) a possibilidade de aplicar a pena mínima de 3 (três) anos de reclusão prevista em legislação anterior ( Lei n.º 6.368/76) ser combinada com a causa especial de diminuição de pena prevista no art. 33, §4º da Lei nova (Lei n. 11.343/06) sob o argumento de que a combinação de Lei Penal não viola a Tripartição dos Poderes previstas no art. 2º da Constituição Federal de 1988 assim como fundamentada da irretroatividade da lei penal mais grave e ultratividade da lei penal mais benéfica, desde que o fato tenha ocorrido na vigência da Lei anterior;
b) admitiu-se ainda a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos desde que fossem preenchidos os requisitos objetivos (incisos I e II) e subjetivos (inciso III) do art. 44 do Código Penal: Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998). I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998). II – o réu não for reincidente em crime doloso; (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998). III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente. (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998).
Portanto, decisões benéficas sob um cunho democrático pautaram tanto o Supremo Tribunal Federal como o Superior Tribunal de Justiça. Neste contexto tentou-se desconsiderar o caráter de hediondez do tráfico de drogas aplicável a causa especial de diminuição de pena, pois um delito onde se aplica uma pena alternativa (pena restritiva de direitos) sendo considerado como hediondo provocaria debates doutrinários e jurisprudenciais no sentido da proporcionalidade sendo violada ou não.
Mas, conforme HC 161.135; HC 149.942; HC 161135; HC 149942 o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal (STF: decisão liminar no HC 102.881/SC, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe de 11/03/2010) entenderam que, mesmo com a citada causa especial de diminuição de pena aplicável, o delito continua sendo hediondo, mesmo porque nem a Constituição Federal de 1988 e nem a Lei dos Crimes Hediondos estabelecem ressalva alguma. O art. 2º da Lei dos Crimes Hediondos refere-se a tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, genericamente, portanto onde o legislador não excepciona, não cabe ao intérprete fazê-lo.
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