Análise jurídica
Continuando com o famigerado caso Bruno, trataremos do crime de homicídio. Antes uma observação: muito se fala que Bruno seria acusado do crime de agressão. Entretanto, não existe qualquer tipo penal que trate de "agressão". O que ocorre é que de uma agressão podemos ter o crime de homicídio, lesão corporal, caso seja física, ou calunia, caso seja moral.
Superada esta parte vamos ao tipo penal em análise.
O art. 121 assim reza:
Art. 121. Matar alguém:
Pena - reclusão, de seis a vinte anos.
Caso de diminuição de pena
§ 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, ou juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.
Homicídio qualificado
§ 2° Se o homicídio é cometido:
I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe;
II - por motivo fútil;
III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum;
IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido;
V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime:
Pena - reclusão, de doze a trinta anos.
Homicídio culposo
§ 3º Se o homicídio é culposo: (Vide Lei nº 4.611, de 1965)
Pena - detenção, de um a três anos.
Aumento de pena
§ 4o No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos. (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)
§ 5º - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar à pena, se as conseqüências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária. (Incluído pela Lei nº 6.416, de 24.5.1977)
Logo no caput do art. 121 temos o chamado homicídio simples. O tipo é composto por um núcleo matar e por um elemento objetivo alguém Matar tem o significado de tirar a vida; alguém diz respeito a ser vivo da raça humana. Rogério Greco afirma que "o ato de matar alguém tem o sentido de ocisão da vida de um homem por outro homem".
Já o § 1° do art. 121 prevê o chamado homicídio privilegiado, entendido como causa especial de redução de pena, ou seja, uma minorante. Logo apos, no § 2° temos o chamado homicídio qualificado.
Tanto o sujeito ativo quanto o passivo podem ser qualquer pessoa, pois se trata de um crime comum. Ressalte-se apenas que o matar alguém deve ser realizado por um homem contra um homem. O objeto material do delito é a pessoa contra a qual recai a conduta e o bem juridicamente protegido é a vida.
Novamente citando Rogério Greco, "a proteção da vida começa do inicio do parto, encerrando-se com a morte da vitima". Por se tratar de um crime contra a vida, a prova da vida é de fundamental importância para caracterização do delito. Nelson Hungria afirma que "a respiração é uma prova, ou melhor, a infalível prova da vida". Assim, podemos determinar que iniciado o parto cessa a possibilidade de haver o crime de aborto e passa-se exclusivamente a possibilidade do crime de homicídio. Ademais, cabe observar que não se faz necessário comprovar a viabilidade da vida, basta que haja vida.
Ponto importante no Caso Bruno é a possibilidade de não se achar o corpo. Tratando-se de crime material, o homicídio para que possa ser atribuído a alguém exige a confecção do exame de corpo de delito, direto o indireto, nos termos do art. 158 e 167 do Código de Processo Penal, a saber:
Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.
Art. 167. Não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta.
Eugenio Pacelli esclarece que "deixando vestígios a infração, a materialidade do delito e/ou a extensão de suas conseqüências deverão ser objeto de prova pericial, a ser realizada diretamente sobre o objeto material do crime, o corpo de delito, ou, não mais podendo sê-lo, pelo desaparecimento inevitável do vestígio, de modo indireto. O exame indireto será feito também por meio de peritos, só que a partir de informações prestadas por testemunhas ou pelo exame de documentos relativos aos fatos cuja existência se quiser provar, quando então se exercerá e se obterá apenas um conhecimento técnico por dedução".
Deve-se ter em mente que não é uma mera dificuldade que permite a prova testemunhal, mas apenas a ausência completa de possibilidade de realização de exame de corpo delito, direito ou indireto.
A consumação do crime ocorre com a morte, sendo perfeitamente admissível a tentativa, por se tratar de crime material.
O homicídio privilegiado, já citado, é causa especial de diminuição de pena, aplicada as hipóteses previstas. O §1º afirma que haverá diminuição de pena quando o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou quando age sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima. No que se refere ao motivo de relevante valor social ou moral, temos que deixar claro que a relevância deve restar demonstrada. Relevante valor social é aquele que se encontra de acordo com os interesses da sociedade, não importando tão somente a esfera pessoal do agente, que é levado em consideração quando a relevância for moral. Já quando o agente comete o crime sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, três elementos devem ser apreciados: a) sob o domínio de violenta emoção; b) logo em seguida; c) injusta provocação da vítima. Ou seja, o agente deve estar completamente dominado pela situação, que lhe gerou violenta emoção, logo em seguida, denotando relação de imediatidade, dentro de um critério de razoabilidade, de uma provocação a qual tem qualquer participação nesta conduta.
O homicídio qualificado, de acordo com Roque de Brito Alves, "é o homicídio acompanhado de certas circunstâncias agravantes que a lei, em relação ao homicídio, tomou em consideração especial para o efeito da majoração a prior da pena devido ao maior ou mais intenso grau de criminosidade, de perversidade ou de perigosidade que revelam do agente, de grande intensidade de dolo".
Podemos dividir as qualificadoras do crime de homicídio em quatro grupos: motivos (mediante paga promessa, ou por motivo torpe; motivo fútil), meios (com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou que possa resultar perigo comum), modos (à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação de outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido), fins (para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou a vantagem do crime). Esta divisão em grupos facilita bastante o estudo. Assim, trataremos apenas alguns conceitos que diferenciam algumas das qualificadoras.
MOTIVOS. Por interpretação analógica, tanto a paga quanto a promessa de recompensa são considerados motivos torpes. Torpe é o motivo que causa repugnância, repulsa que contrasta violentamente com o senso ético, pelo fato praticado. Fútil é o motivo insignificante, desproporcional, "aquele onde há um abismo entre a motivação e o comportamento extremo levado a efeito pelo agente" nas palavras de Rogério Greco. Ocorrendo mais de uma qualificadora, uma delas servirá para qualificar a infração e as demais serão utilizadas como circunstancia agravante;
MEIOS. Aqui apenas se faz necessário distinguir insidioso de cruel. Insidioso é o meio utilizado pelo agente sem que a vítima tenha conhecimento; cruel é aquele que causa sofrimento excessivo;
MODOS. Traição é enganação, infidelidade. Aquele em que o agente ataca a vítima de súbito. Emboscada pode ser entendida como uma espécie de traição, em que o agente se coloca escondido, de tocaia. Dissimular é ocultar a intenção.
Por fim, importa informar que o homicídio qualificado é definido como hediondo, nos termos do art. 1º, inciso I da Lei 8.072/90. Ressalte-se que há possibilidade de o homicídio simples ser identificado como hediondo, bastando que seja praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente.
No próximo post, trataremos de concurso de crimes.
Fonte: www.decaraparaodireito.blogspot.com
O Processo Penal como sismógrafo da Constituição e o Supremo Tribunal Federal - teoria, análise crítica e práxis - por Júlio Medeiros.
Nélson HUNGRIA
"Ciência penal não é só interpretação hierática da lei, mas, antes de tudo e acima de tudo, a revelação de seu espírito e a compreensão de seu escopo para ajustá-lo a fatos humanos, a almas humanas, a episódios do espetáculo dramático da vida." (Hungria)
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