LUIZ FLÁVIO GOMES*
Áurea Maria Ferraz de Sousa**
Mesmo em hipótese de tráfico de drogas o julgador há de fundamentar a negação de liberdade provisória em uma das hipóteses justificadoras da preventiva. Esta foi a conclusão do Ministro Gilmar Mendes, relator do Habeas Corpus (HC) 108.266/SP, julgado em 18.05.11 (STF).
Com este posicionamento, ele determinou que o juiz de primeira instância reveja o pedido de liberdade provisória da paciente acusada de tráfico de drogas por ter sido encontrado em sua residência cinquenta e seis quilos de cocaína. Nas instâncias inferiores, a negativa do pedido sempre apresentou a mesma fundamentação: a restrição legal da Lei de Drogas (art. 44, Lei 11.343/06).
Para o Ministro, embora haja expressa previsão legal impedindo a liberdade provisória aos crimes de tráfico de drogas, a decretação da prisão há de ser idoneamente fundamentada em uma das hipóteses que autorizam a prisão preventiva, o que não se constatou no caso do presente writ.
De acordo com Mendes, “não basta a mera explicitação textual dos requisitos previstos, sendo necessário que a alegação abstrata ceda à demonstração concreta e firme de que tais condições realizam-se na espécie” (STF).
Ainda encontra-se em trâmite no STF o HC 100.949/SP que discute a inconstitucionalidade do artigo 44 da Lei de Drogas. No dia 31.08.2010, a Segunda Turma deliberou afetar ao Plenário do STF o julgamento do feito. No último dia 11.03, os autos foram conclusos ao relator.
Até o momento, a jurisprudência do STF, em geral, aceita a regra taxativa do mencionado artigo, impedindo a liberdade provisória aos acusados de tráfico de drogas. Mas, de se notar, que a orientação também é firme no sentido de que a prisão há de estar fundamentada em algumas das hipóteses de prisão preventiva.
Neste sentido, alguns trechos de julgados: “É plenamente justificada a manutenção da custódia cautelar decorrente da prisão em flagrante por tráfico de drogas quando, além da proibição da liberdade provisória legalmente imposta pelo art. 44 da Lei nº 11.343/06, estiverem presentes os requisitos previstos no art. 312 do CPP” (HC 107415/GO, 01.03.11); “A vedação à liberdade provisória para o delito de tráfico de drogas advém da própria Constituição Federal, a qual prevê a inafiançabilidade (art. 5º, XLIII), e do art. 44 da Lei 11.343/2006” (HC 104616/MG, 21.09.10).
Particularmente, continuamos subscrevendo a tese da inconstitucionalidade do artigo 44 da Lei de Drogas (no que tange à proibição da liberdade provisória). O que vemos é uma postura totalmente equivocada do legislador (data vênia) no sentido de colocar nas leis proibição genérica da liberdade provisória (para alguns crimes).
O legislador ordinário não pode prever nos textos legais proibições genéricas de liberdade provisória. Essa função compete ao juiz, concretamente, depois de analisar as circunstâncias do caso. Desvio de função claríssima do legislador, que acaba se exorbitando quando faz uso do ovo de serpente contido no inc. XLIII do art. 5º da CF (o que prevê restrições para o crime hediondo). O legislador ordinário não pode ir além do que esse dispositivo contempla (Min. Ayres Britto). O legislador não pode usurpar funções do juiz (Min. Celso de Mello).
*LFG – Jurista e cientista criminal. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001).
**Áurea Maria Ferraz de Sousa – Advogada pós graduada em Direito constitucional e em Direito penal e processual penal. Pesquisadora.
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