Supremo Tribunal Federal (STF)

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Nélson HUNGRIA

"Ciência penal não é só interpretação hierática da lei, mas, antes de tudo e acima de tudo, a revelação de seu espírito e a compreensão de seu escopo para ajustá-lo a fatos humanos, a almas humanas, a episódios do espetáculo dramático da vida." (Hungria)

sábado, 24 de abril de 2010

Suspensão do processo pelo art.366 do CPP não pode implicar perseguição "ad eternum" - análise da Súmula 415 do STJ

Teor da Súmula 415 do STJ:

"O período de suspensão do prazo prescricional é
regulado pelo máximo da pena cominada".


Alguns precedentes da Corte Especial:

HABEAS CORPUS Nº 84.982 - SP (2007/0137297-0)
RELATOR : MINISTRO JORGE MUSSI
IMPETRANTE : THAIS JUREMA SILVA
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PACIENTE : SÍLVIO CÉSAR RODRIGUES

EMENTA

PROCESSUAL-PENAL. AÇÃO PENAL. NÃO-ATENDIMENTO
À CITAÇÃO EDITALÍCIA. REVELIA. SUSPENSÃO DO
PROCESSO E DO CURSO DO LAPSO PRESCRICIONAL.
ART. 366 DO CPP. EXISTÊNCIA DE LIMITE PARA
DURAÇÃO DO SOBRESTAMENTO. PRAZO REGULADO PELO
PREVISTO NO ART. 109 DO CP, CONSIDERADA A
PENA MÁXIMA APLICADA AO DELITO DENUNCIADO.
PRESCRIÇÃO EVIDENCIADA. COAÇÃO ILEGAL
CONFIGURADA. ORDEM CONCEDIDA. EXTINÇÃO DA
PUNIBILIDADE DECLARADA.
1. Consoante orientação pacificada nesta Corte, o prazo
máximo de suspensão do prazo prescricional, na hipótese do
art. 366 do CPP, não pode ultrapassar aquele previsto no
art.109 do Código Penal, considerada a pena máxima cominada
ao delito denunciado, sob pena de ter-se como permanente o
sobrestamento, tornando imprescritível a infração penal apurada.
2. Lapso prescricional referente ao delito denunciado preenchido.
3. Ordem concedida para, com fundamento nos arts. 107, IV
c/c 109, V, declarar a extinção da punibilidade do paciente,
pela prescrição da pretensão punitiva Estatal.



HABEAS CORPUS Nº 34.345 - SP (2004/0036387-4)
RELATOR : MINISTRO GILSON DIPP
IMPETRANTE : ORLANDO GONÇALVES DE CASTRO JUNIOR -
PROCURADORIA DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA
IMPETRADO : PRIMEIRA CÂMARA DO TRIBUNAL DE ALÇADA CRIMINAL
DO ESTADO DE SÃO PAULO
PACIENTE : ELISIANO ALVES CAMELO

EMENTA

CRIMINAL. HC. DISPARO DE ARMA DE FOGO EM LOCAL
HABITADO. SUSPENSÃO DO PROCESSO NOS TERMOS DO ART. 366 DO CPP.
SUSPENSÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. LIMITE. PRESCRIÇÃO
CARACTERIZADA. ORDEM CONCEDIDA.
I . O art. 366 do CPP não fixa prazo máximo tanto para
o período da suspensão do curso processual, quanto
para a implementação do lapso prescricional.
I I .Admitir que a suspensão do prazo prescricional siga
indefinidamente significaria tornar imprescritíveis condutas
cuja punição abstratamente cominada seja branda.
I I I .O parâmetro para o limite da suspensão
do curso do prazo prescricional, em caso de suspensão
do processo nos termos do art. 366 do CPP, é aquele
determinado pelos incisos do art. 109 do Código Penal, a
dotando-se o máximo da pena abstratamente
cominada ao delito. Precedentes.
IV. Prescrição que deve ser reconhecida - considerando-se
a pena máxima cominada ao delito de disparo de arma de fogo
em local habitado e a menoridade do paciente – se, entre
o último marco interruptivo da contagem do prazo
prescricional e a presente data já transcorreu o
período de 02 (dois) anos.
V. Ordem concedida, para declarar extinta a punibilidade
do paciente, em razão da prescrição.


Em doutrina, assim se manifesta o Professor Dámasio E. de Jesus,
no Boletim IBCCrim, n° 42, p. 3, verbis:

"O prazo da suspensão da prescrição não pode ser eterno.
Caso contrário, estaríamos criando uma causa de imprescritibilidade.
As hipóteses que não admitem a prescrição estão enumeradas
na CF (ar. 5o, XLIV), não podendo ser alargadas pela lei ordinária.
Ora, permitindo-se a suspensão da prescrição sem limite temporal,
esta, não comparecendo o réu em Juízo, jamais ocorreria,
encerrando-se o processo somente com sua morte, causa extintiva
da punibilidade (CP, art. 107, I).

Se, em face do crime, o Estado perde, pelo decurso do tempo,
a pretensão punitiva, não é lógico que, diante da revelia,
pudesse exercê-lo indefinidamente. Por isso, entendemos que o
limite da suspensão do curso prescricional corresponde aos
prazos do art. 109 do CP, considerando-se o máximo da pena
privativa de liberdade imposta abstratamente.

Assim, p. ex., suspensa ação penal por crime de lesão corporal
leve (CP, art. 129, caput), o impedimento do curso prescricional
tem o termo máximo de quatro anos (CP, art. 109, V), i.e,
o prazo prescricional da pretensão punitiva só pode ficar
suspenso por quatro anos. Nesse limite, recomeça a ser contado
o lapso extintivo, que é de quatro anos, considerada a pena
máxima abstrata, computando-se o tempo anterior à suspensão.

Cremos constituir um critério justo. Se, para permitir a perda
da punibilidade pela prescrição o legislador entendeu adequados
os prazos do art. 109, da mesma forma devem ser apreciados como
justos na disciplina da suspensão do prazo extintivo da pretensão punitiva."


Por fim, sobre o tema assim se manifestam Luiz Flávio Gomes e
Silvio Maciel, em artigo puplicado no site Jus Navigandi:


(...)

É preciso ressaltar que a Súmula 415 está a dizer que a contagem da prescrição fica suspensa pelo prazo da prescrição em abstrato – consideradas as balizas do art. 109 do CP – e não pelo prazo da pena máxima cominada ao delito, conforme pode sugerir uma leitura desavisada do enunciado.

Assim, se o delito tem pena máxima cominada de 4 anos, a prescrição em abstrato se dá em 8 anos (art. 109, IV do CP) e a contagem da prescrição, portanto, ficará suspensa por esses 8 anos e não por 4 anos, que é o prazo da pena máxima cominada ao crime. Essa é a correta interpretação da Súmula 415, conforme se verifica pelos precedentes que a originaram. A propósito:

"Consoante orientação pacificada nesta Corte, o prazo máximo de suspensão do prazo prescricional, na hipótese do art. 366 do CPP, não pode ultrapassar aquele previsto no art. 109 do Código Penal, considerada a pena máxima cominada ao delito denunciado, sob pena de ter-se como permanente o sobrestamento, tornando imprescritível a infração penal apurada".
(STJ, HC 84.982/SP, rel. Min. Jorge Mussi, j. 21.02.2008)

(...)

(...) é certo que a Constituição estabeleceu, taxativamente, as hipóteses de imprescritibilidade - nos crimes de racismo e na ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático – exatamente para proibir a imprescritibilidade em qualquer outro delito, ressalvada a dos delitos contra a humanidade, nos termos do direito universal emanado da ONU. Trata-se de "silêncio eloqüente" da Constituição brasileira. Não tem sentido afirmar que o legislador ordinário pode tornar imprescritível um delito de desacato ou de furto.

Na clássica lição de Carlos Maximiliano, normas restritivas de direitos fundamentais devem ser interpretadas restritivamente, para restringir ao mínimo o direito posto. É assim que deve ser interpretado o nuclear artigo 5º da Constituição. Se o dispositivo permitiu a imprescritibilidade apenas em duas hipóteses é porque a proibiu em qualquer outra.

Esperemos, pois, que o Supremo Tribunal Federal se curve ao entendimento da sua maioria e imponha um prazo final para o período de suspensão da contagem da prescrição estabelecida no art. 366 do CPP. Não só porque a suspensão pressupõe prazo final, mas porque essa exegese se coaduna melhor com o instituto da prescrição, que visa a impedir processos e execuções penais depois de anos ou décadas, quando já tenha desaparecido (completamente) o interesse social de
punição do infrator.


Por: Júlio Medeiros

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